"Dia Maior", de Né Barros, no TeCA
Uma das coreógrafas mais interessantes do panorama nacional de dança contemporânea, Né Barros regressa amanhã, quinta-feira, ao TeCA com mais uma proposta a não perder. Sobre "Dia Maior" já tive a oportunidade, à convite da própria para o TNSJ e por sugestão editorial para "O Comércio do Porto", de expressar por duas vezes a minha leitura sobre o projecto. Observei o espectáculo em dois contextos diferentes, a criatividade, ousadia e profundidade das questões Né Barros levanta continuam a seduzir-me profundamente e a cativar-me pela sua inteligência na abordagem do universo semiótico e relacional do corpo. Depois do desconcertante "Vaga", que para além de ter absorvido grande parte das referências cinematográficas, de Lynch a Cronenberg, que povoam o meu imaginário, levantou-me uma série de questões tão pertinentes quanto inquietantes sobre as extensões autónomas da memória genética do corpo, com o uso, inteligente, das "mala-monitor" e com um conjunto de construções coreográficas cativantes e coerentes, em "Dia Maior" a experimentação, o abandono viagiado, a fuga para as sombras do tempo produziram um espectáculo mais orgânico, conduzindo a problemática das relações inter/corporais, espacio/temporais e de comunicabilidade/identidade por territórios provocantes, sedutores e inquietantes. Na sua quinta colaboraçã com N+e Barros, Alexandre Soares sobe ao palco, contagiando, desde o nascimento até à morte, o mais recente trabalho de Né. Apesar de manter a referências que lhe são quase genéticas da sétimas arte, tão bem expressas na obras de Canijo, o guitarrista dos TTT alimenta movimentos de ruptura com o preconcebido, protagonizando sobreconstruções arrepiantes, surpreendendo pelo dinamismo e criatividade do "live act" apontado em várias direcções do abstrato, outro território que me atrai bastante. "Dia Maior" resulta de vários dias menores em perpétua reconstrução, interiores/exteriores, plurais e unos, dilatados e comprimidos, em micro-narrativas do acordar solitário, do conflito do corpo enquanto objecto de um desejo, símbolo, emissor de signos, à epifania do Outro, enquanto possibilidade última de salvação na descoberta da identidade na comunicação, na transcendência, na metafisicalidade. Proposta a não perder, "Dia Maior" inaugura a amanhã a programação 2005 do TeCA. Dança contemporânea no seu melhor nível no Teatro Carlos Alberto, do Porto, até sábado às 21h30.
1 comment:
WAW Ou a peça é mesmo muito interessante ou são as tuas palavras que a transformam em "dança a não perder", mas confio na tua inteligência para destrinçar o trigo do joio. Epifania do Outro?? É muita filosofia de Levinas...
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