Hipocrisia política sobre a candidatura galaico-portuguesa à UNESCO:
Pela primeira vez, dois países da União Europeia apresentam uma candidatura conjunta à UNESCO. Portugal e Galiza pretendem unir esforços para verem a cultura comum ser reconhecida pela organização intergovernamental como Património Imaterial da Humanidade. Entregue à UNESCO em Outubro do ano passado, o projecto foi apresentado oficialmente ao público ontem no edifício da Alfandega, no Porto, numa operação de charme, a roçar o ridículo, em busca de apoios privados. Promovida, entre outras instituições, pela Comunidade de Trabalho Galiza - Norte de Portugal, a operação conheceu no Ministro das Cidades, José Luís Arnaut, e no presidente do Governo Antónomo da Galiza, Manuel Fraga Iribarne as figuras centrais do evento, que contou ainda com a presença do autarca do Porto, Rui Rio.
Foram repetidos de forma o mais genérica e superficial possível os aspectos mais importantes da cultura galaico-portuguesa, dos cantares às danças, da base linguística ao artesanato. A ideia é preservar e difundir uma cultura que se encontra em vias de extinção. No meu entender, antes de apelarem à UNESCO, os governantes deveriam ter alguma vergonha pelo trabalho que não têm desenvolvido nesta matéria. A começar pelo governo português que, a título de exemplo, este ano, através do Ministério da Cultura, decretou a morte, retirando o apoio habitual, ao Centro de Música Tradicional Sons da Terra, que funciona desde Setembro de 2000 em Sendim, concelho de Miranda do Douro, e que possui, entre outras valências, o maior acervo áudio de música, cantares e histórias tradicionais desta região. Este é apenas um dos muitos exemplos possíveis que revelam a importância que o governo português atribui à cultura do norte de Portugal. Em termos locais, é quase uma piada de mau gosto, encontrar Rui Rio numa cerimónia de promoção cultural. O Porto, que deveria ser a primeira cidade a fomentar a cultura da sua região, sob a presidência de Rio, tem organizado festas culturalmente tão típicas e relevantes como a do próximo baile de carnaval protagonizado pelo grupo Diapasão, naturalmente com o aval da Rádio Festival, uma ligação mais do que obscura que em breve será posta nu.
Da parte da Galiza, basta referir que o presidente desta região autónoma, Manuel Fraga Iribarne, tem tanto gosto em preservar e difundir a cultura da sua terra, que ontem, discursou em castelhano. No final da cerimónia e com muita razão, um grupo de professores galegos, a leccionar em Pontevedra, manifestou-se indignado com o facto do presidente da Galiza ter discursado em Castelhano e não na língua galega. Conversei com uma das professoras que nem queria acreditar no que tinha ouvido. "Estamos profundamente chocados com isto. Sinceramente - disse Carmen Souto Negrete - este senhor não nos representa. Viajámos várias horas para assistir a uma cerimónia de apresentação o promoção de uma cultura que tem como uma das bases a língua e se candidata a património da humanidade e ouvir falar o presidente da Galiza a falar em castelhano é no mínimo uma contradição e um escândalo".
Naturalmente, quando a UNESCO sair para o terreno, irá verificar como é que se encontram as estruturas culturais do nordeste transmontano, no Minho e na Galiza, e meterá a candidatura na gaveta, sem antes dizer aos responsáveis para terem alguma vergonha na cara, pois antes de se candidatarem a património da humanidade, devem ser os próprios a considerarem a sua cultura como um património e fazerem algum esforço para a preservar...
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