"Ossário", de Mark O`Rowe, pela Assédio
Depois da estreia d´ “A Testemunha”, da sueca Cecilia Parkert, a companhia Assédio regressa ao Pequeno Auditório do Rivoli, à temática violência contemporânea, em formatdo de monólogo. A mais recente proposta, “Ossário”, do irlandês Mark O´Rowe estreia hoje à noite com encenação a cargo de João Cardoso. Uma descarga centrada no poder da palavra poética, brilhantemente traduzida por Francisco Luís Parreria, ganhar carne e rosto em três mulheres que partilham numa viagem marcada pela perda de humanidade numa cidade imaginária, mais perto de nós que se provavelmente seria de desejar. Da sarjeta mais suja e repelente ao rio mais límpido e inocente, as emoções brutam do verbo dito no feminino.
Estreante na Assédio, Isabel Queirós é Olive Day, uma marginal sem pudor nem receio da morte; a experiente Rosa Quiroga, Allison Ellis, uma mãe angustiada com a velhice e o declínio físico, e finalmente, a seguríssima Alexandra Gabriel é Tilly McQuarrie, uma “Christiane F”, sem qualquer espécie de futuro ou esperança de humanidade.
Olive Day inaugura a tríade de monólogos descrevendo uma paisagem ribeirinha, onde brincam alguns miúdos. Apesar de rapidamente se dissipar na violência suburbana, a aguarela de paz e tranquilidade do rio funciona como chave de abertura e encerramento de toda a narrativa. Allison Ellis. Envergonhada por estar a envelhecer confessa a pulsão pela segurança e o dever de cuidar o rebento. “O meu filho tornou-se um estranho para mim”, confessa. Finalmente, Tilly McQuarrie. Uma arrumadora de carros perto de si, vende o corpo para arranjar dinheiro para a heroína. Um esquelo humano em decomposição, a caminho da morte.
Três mundos que se cruzam numa narrativa de vingança, marcada por um dramatismo visceral, pungente, sugestivo e imagético. Entre crimes sem castigo, histórias gangsters e chulos, as atmosferas de subúrbio omnipresentes na obra de Mark O´Rowe, fica a oportunidade de conhecer um dos mais jovens talentos da dramaturgia irlandesa. "Ossário" permanece no Pequeno Auditório do Rivoli até ao próximo sábado, dia 20 de Março.
2 comments:
infelizmente ainda não tive oportunidade de ver. Mas fiquei com uma ideia do que veria se lá fosse... obrigado.
De nada. A peça exige alguma disponibilidade mental. Sendo formalizada em três monólogos, pode ser uma decepção para quem estiver à espera de um teatro mais "movimentado". No entanto, o texto, apesar de não ser arrebatador, contém uma lírica interessante que joga de forma muito orgânica com a violência das nossas "urbes". Uma proposta dramática contemporânea que serve que nem uma luva à Assédio.
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