Coliseu do Porto oferece o pior da música brasileira
Com uma programação cada vez mais afastada das grandes digressões mundiais do planeta rock/pop (a última foi em Julho de 2002, com os Radiohead em dose tripla) e cada vez mais próxima das festas paroquiais e dos aniversários "pimba" desta ou daquela rádio para taxista e dona de casa ouvir, o Coliseu do Porto sobrevive entre bailados russos de qualidade duvidosa e o pior da música brasileira. Só neste mês de Novembro, o público do norte teve mesmo de apanhar com três artistas menores vindos outro lado do Atlântico, entre uma Ivette Sangalo e um Alexandre Pires, sobrou uma Maria Rita sobrevalorizada, exausta e sem nada de novo para apresentar. Volvida quase uma década sobre a conquista de uma das mais emblemáticas salas de espectáculos do Porto à IURD, fica a ideia de que o resultado actual arrisca-se a não compensar o esforço do passado recente. Se Maria Rita está para Alexandre Pires como Dulce Pontes para Tony Carrera, é verdade que tentei fugir à primeira, mas por motivos profissionais e de karma, vi-me obrigado a assistir ao "show" deste último, pagando assim por alguns excessos e pecados que cometi na juventude. A experiência de quase duas horas a ouvir Alexandre Pires revelou-se tão dolorosa quanto agónica, a roçar um terrorismo cultural situado algures entre a telenovela brejeira "made in Brasil" e a festa popular no bairro da Tijuca ou do Aleixo, na melhor das hipóteses.
Com um Coliseu transformado numa espécie de convenção de casas de alterne e encontro distrial de gunas brasileiros, foi aos perfumes da feira de Custóias e aos sotaques do nordeste brasileiro que a invicta casa de espectáculos ficou entregue na noite de quarta-feira. O palco transformado numa discoteca de subúrbio apresentava lençóis pretos e brancos em "background" a combinar numa sintonia desconcertante de mau gosto com a camisa branca colada ao tronco musculado e as calças de couro negras do artista de Minas Gerais. Depois de perto de duas horas de terapia de choque, durante as quais o ex-vocalista dos Só Para Contrariar encantou uma multidão de compatriotas com refrões reveladores de uma inteligência e amplitude gramatical tão singular como "amo você, meu amor" ou numa dedicatória a Roberto Carlos "amei errado, pisei na bola", o artista acabou, finalmente, o espectáculo abençoando a "galera" em nome de N.S. da Aparecida e S. N. de Fátima, pedindo aos fãs - e aqui vem a grande novidade da noite, que revela, desde logo, a elevada consideração intelectual que o cantor tem pelos seus seguidores - para não se esquecerem de que "o natal é o nascimento de Jesus". Para quê impedir a IURD de se transformar o Coliseu num "McDonald´s" da fé, quando do outro lado do Atlântico nos chegam pastores vestidos com pele de intérpretes de música popular brasileira. Que regresse ao Porto, mesmo a cantar em inglês, Caetano Veloso, que infelizmente este ano ficou-se por Lisboa, ou na pior da hipóteses, uma cada vez mais infantil e comercial Adriana Calcanhoto. Enquanto, do outro lado do Atlântico não aterrar qualquer novidade, eu insisto em ouvir "Elis & Tom", por teimosia e paixão. Lamentável é que, num país invulgarmente abençoado por inúmeros talentos musicais, a Portugal e ao Porto, em particular, só cheguem sobretudo exemplos que manifestamente transmitem uma imagem redutora da verdadeira e superlativa fescura da música e da cultura brasileiras.
1 comment:
Vamos todos ficar viciados. Pelo menos, a arte não mata. Pode, quando muito, revelar suicídios da alma. Não será certamente este o caso.
Sorte e boas trips artísticas são os votos da vizinha... do lado.
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