Fernando Lemos: homenagem do CPF
O Centro Português de Fotografia (CPF) homenageou e muito bem, no final da tarde de anteontem, na Cadeia da Relação do Porto, o artista e pensador português Fernando Lemos, com a estreia do documentário homónimo realizado pelo cineasta brasileiro Olívio Tavares de Araújo. O filme afirma-se, sobretudo, como uma ferramenta analítica indispensável, contendo material de consulta obrigatória para a concretização de trabalhos académicos sobre a vida e obra de tão singular e influente figura no meio artístico luso-brasileiro.
Apesar de reconhecido em Portugal, sobretudo nas últimas décadas, pelo seu importante legado fotográfico, tendo recebido em 2001 o Prémio Nacional de Fotografia, Lemos afirma-se sobretudo como artista plástico com frequentes incursões pela pintura e desenho, inserido no movimento surrealista português dos anos 40. O próprio homenageado desvaloriza ou pelo menos marginaliza a sua obra fotográfica confessando que "foi atrás da fotografia como poderia ter ido atrás da cerâmica ou de outra coisa qualquer."
O trabalho em formato vídeo de Olívio Tavares de Araújo inicia e termina uma viagem pela vida e obra de Lemos a partir dos seus trabalhos fotográficos realizados essencialmente nas décadas de 40/50 e que retratam de forma intuitiva e plena de sensibilidade uma geração de notáveis da cultura portuguesa, de Sophia de Mello Breyner a Mário Cesariny passando por Jorge de Sena e José Viana.
Homem de esquerda, simpatizante não filiado no PCP e naturalmente asfixiado pelo Antigo Regime, Lemos refugia-se do outro lado do Atlântico, em 1953, desenvolvendo a partir de S. Paulo grande parte da sua importante produção artítica. Apenas quatro anos mais tarde, em 1957, participa na IV Bienal de São Paulo, dividindo o prémio de Desenho com Wega Nery, conquistando, desde logo, a atenção, respeito e admiração da comunidade artística brasileira.
Portugal recupera, a partir do Porto, "a minha Lisboa a preto-e-branco", o legado fotográfico de Lemos, na exposição colectiva "A fotografia na arte moderna portuguesa", realizada no final da décda de 70. Já, em 1982, Lisboa, cidade natal do artista, desperta, para os seus trabalhos com a mostra "Refotos dos anos 40". Mais tarde, e por iniciativa do fotógrafo português Jorge Molder, a Gulbenkian organiza duas exposições individuais: a primeira, em 1992, em Paris, reunindo meia dezena de fotografias, durante o "Mois de la Photo", e uma segunda e mais ampla incursão pela obra de Lemos, já em formato de retrospectiva, intitulada "À sombra da luz", em 1994.
Pensador livre e conversador compulsivo, Fernando Lemos afirmou-se bastante satisfeito com o documentário de Olívio Tavares de Araújo, "um amigo que me conhece bem" e contente por se reencontrar com uma cidade geneticamente fotográfica, que tem permanecido atenta à sua obra. Um apontamento final para destacar o excelente trabalho que Teresa Siza tem vindo a desenvolver à frente do CPF, um raro mais pleno exemplo de como dinamismo, bom senso e criatividade podem sobreviver no seio de uma institução pública.
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