Repórter Estrábico no Rivoli
Acabo de regressar a casa vindo directamente do pouco divulgado concerto dos Repórter Estrábico (RP), no mais do que improvável, inadequado, Café Concerto do Rivoli. Não passei pela casa de partida nem recebi dois contos, mas tive tempo para "profundamente desinquietado - arreliado até - com a blitragem impune e emergente", encontrar na actuação dos RP um "Requiem" oportuno com alguns momentos de eurosátira urgentes, desde logo, para agitar o marasmo em que se encontra a música feita em Portugal - actualmente sustentada artificalmente pela nova vaga de fadistas, sobre os quais lanço, desde já, as minhas mais fortes reservas, pois ainda estão por determinar, a médio prazo, pelo menos, as consequências da subtracção de alguma poesia, enquanto âmago da música sacrossanta de Amália e respectivos diáconos. Uma desconfiança que alargo desde já à hospitalidade lusa a fenómenos como Maria Rita, que amanhã ocupa, novamente, o Coliseu do Porto, sem trazer nada de novo na bagagem e com uma digressão de fazer inveja a muito boa gente.
De regresso ao Rivoli, a trupe subversiva de Luciano Barbosa revelou-se um projecto "cristalizado musicalmente", embora pertinente e mordaz na proposta "Eurovisão". Já tinha escutado em atenção o registo 2004 dos RP e, tal como no concerto, a dicotomia entre o meio e a mensagem acaba, infelizmente, por remeter o colectivo ao insucesso. Dos temas frescos apresentados em versão "live", destaque tão natural como evidente para "Arrumador", uma crónica tóxico-social ao problema da droga nas grandes cidades, com os "moedinhas" a servirem de munição para um tiro certeiro em direcção a Paulo Morais que ainda não se demitiu da Câmara do Porto. "Tens em mim um sujeito competente/capaz de lidar com toda a gente/nem pró caldo eu faço uma pausa/quando estou angriando para a causa."
Vestido de forcado, Líder apresentou-se, desde logo, disposto a dar o corpo ao manifesto, desde que "não me proíbam de fumar o meu SG Viltro com pesticidas". Sem tempo para nicotina, "Biltre" fez da sátira uma arma de destruição política. "Portugal não está de tanga, está de fio dental" (ver foto do álbum). Gritos "fascista, fascista", com apoio VJ de Paulo Américo a projectar, imagine-se, nas paredes no Rivoli Teatro Municipal, imagens de Santana, Durão & companhia. Provavelmente, o momento mais alto de todo o concerto. Ironia, sarcasmo e mensagens tão subliminares quanto subversivas. A recuperação de "MamaPapa" com apoio visual extraído via clip conseguiu ainda sustentar uma agitação distante de se concretizar, apesar dos apelos ao "mosh" do Líder.
"Velcro", versão rock de "Pump the Jam" e o delírio samplesco de "Eurovisão", com "The Final Count Down", dos Europe incluído, antecederam um longo encore de quatro temas. Apesar de toda a pertinência do projecto "Eurovisão", tendo em conta o contexto político actual e um referendo à constituição europeia que irá bater todos os recordes de abstenção, a versão "live", em 2004, revela as fragilidades sonoras de um projecto que, recusando a inclusão de um baterista, não encontra no suporte rítmico da "drum-machine" uma plasticidade sonora capaz de construir um edifício musical consistente, seguro, atractivo. Triunfa uma postura em palco e um cuidado cénico de Luciano Barbosa invulgar pela inteligência e profissionalismo, mas que infelizmente se revela insuficiente para fazer passar a mensagem ao grande auditório.
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